sábado, abril 26, 2008

A Princesa (Meu conto para o concurso: "contos do Rio", cujo tema era "mar")

Pasteur sabe: os acontecimentos mais simples e desprovidos de grandes aspirações culminam em resultados surpreendentes. Assim como a invenção do pneu, foi a descoberta do paulista.

O paulista é aquele cara, que há tempos não sabe o que é tempo. Paulista que é paulista só tem tempo pra gastar no trânsito ou em fila de banco. E este é o típico. Vai ‘a praia no Guarujá, não perde um domingo de macarronada na casa da vó, torce pelo Palmeiras. Recém-formado, trabalha num banco de renome internacional e até tem um certo prestígio apesar da pouca idade e experiência. Quem sabe, até gosta do que faz. Mas principalmente, paulista que é paulista tem medo do Rio... claro, todos os cariocas vão ‘a praia com colete ‘a prova de balas, e é só chegar no aeroporto para ser alvejado... “Bem indo ao Rio de Janeiro! Teu celular é legal? Então é meu!”.

O plano era: aeroporto-taxi-hotel, hotel-taxi-congresso, congresso-taxi-hotel, hotel-taxi-aeroporto e pronto, são e salvo. Ia apresentar seu trabalho no congresso, ganhava prestígio, e quem sabe com isso alguma oportunidade (porque paulista que é paulista gosta muito de dinheiro), tudo isso correndo o risco de uma bala perdida. Seria o herói entre os amigos do banco.
No primeiro passo tudo correu bem, chegou no hotel imune ao complexo da maré e linha vermelha. Porém não contava com isso... o hotel era na avenida Atlântica, seu quarto no décimo-sétimo andar. Olhou a medusa nos olhos, ouviu o canto da sereia... e se apaixonou pela princesinha, a tal da Copacabana. No calçadão, idosos andando (do jeito que só eles sabem. Um, dois, um dois!), pais lavando (com dificuldade... esses meninos não param quietos) os pés dos filhos, jovens alternando água-de-côco com o chope. Tudo isso em meio a uma confusão de carros, e principalmente, de bicicletas.

Tomou coragem e colocou uma bermuda (porque paulista que é paulista não usa sunga) e pisou pela primeira vez na areia de Copacabana. E ao contrário das praias onde havia estado, nesta a areia era fofa, convidativa, não como aquele concreto que não suja o pé quando se sai da água.
Simpatizou com o pessoal da barraca de matte, que ofereceu guardar suas coisas enquanto ele mergulhava. Aquilo era estranho pra ele, “não tem nenhum armário pra alugar aqui não?”.
Então encontrou sua princesinha, e ela estava mais bonita do que quando vista de longe. Esperou pelo momento certo do encontro, e quando as ondas lhe estavam favoráveis, se permitiu levar com a certeza de encontrar braços abertos, oferecendo razões para se apaixonar, em todos os sentidos. Água gelada em contato com o corpo quente por um sol escaldante, dividindo a visão entre o morro no Leme, o forte e o céu azul, que só um dia de verão no Rio sabe pintar...

E a cidade não deixa de ser violenta. Sem tomar conhecimento ela invade teu peito, toma de assalto teu coração. A água gelada machuca a pele, faz a respiração ficar mais rápida. O calor te faz suar, de sunga na sombra, miragem no asfalto. E assim, te seqüestra pra sempre.

A volta pra casa não foi igual. Como a angústia da criança, que faz de tudo pra não ir embora da casa da avó, após meses de férias, chora, finge dor de barriga, pra ganhar só mais um “diazinho”.
A praia do Paulista não é o rio Tietê, nem o parque Ibirapuera... é “copa”.

Do momento em que tomou a princesinha nos braços (porque mar não tem cabelos nos quais se pode agarrar) até hoje, o tempo passou, mas não o amor.
Continuou morando em São Paulo, subiu na vida, casou, teve filhos. A mulher não tem ciúmes de sua princesinha, aliás, aprendeu a amá-la também. Mas o Paulista é aquele do “último mergulho” dia primeiro de janeiro, com o coração apertado, mesmo sabendo que em fevereiro outro primeiro, e outro último mergulho virão.

Hoje já não há a flexibilidade daquele tempo, as corridas no calçadão deu lugar ‘as caminhadas, o futebol ‘as partidas de gamão. Agora, fala com os mais novos com o respeito de quem há tempos admira sua beleza, bradando “aqui era muito mais bonito, o mar era muito mais azul, a faixa de areia era muito mais larga, a seleção de setenta era a melhor”.

Mas sabe que não é menos apaixonado.

Morou no Rio por pouco tempo. Seu coração já não era como antes e não suportou essa intensidade de emoções por muito. Não sofreu, nem deixou de visitar sua princesinha nenhum dia. Cinzas, no mar de Copacabana, e como sempre quis, se deixa afagar e beijar, abraçado por ela. Drummond é testemunha.

quinta-feira, novembro 09, 2006

Anti-Clímax num Palco Burlesco

Estava sozinho. Ele e ela. No metrô. Podia ser até uma história... dois adolescentes se beijando, docemente. O fato é que o metrô estava cheio de esperança, além de gente, mas essa gente só servia de pano de fundo, não teria graça colocar essa gente como algum fator realmente atuante. Mesmo o cara que comia seu pastel, empestando o ar com o cheiro de gordura, tentando invadir com um sentido que não estava sendo usado. Pastel finalizado voltamos com o tato, vendo o casal, já que a visão é um sentido pobre, pois não passavam de um casal de namorados se vistos sem tato.

Era um homem de meia-idade, que era de meia-idade só porque pintava os cabelos e a barba, que estavam mal-feitas e dispostas num rosto marcado pelas longas meias-idades que passaram há muito, quase como um único ser com ela, que era um pouco mais jovem... de meia-idade mesmo. O terno preto, com riscas de giz se contrastava com o vestido florido, assim como o possível propósito da viagem.

As pessoas, ordinárias, serviam realmente como um pano de fundo para eles, primeiro porque estavam realmente sozinhos, e à medida que as estações passavam, como num teatro as pessoas ordinárias ao fundo marcavam os instantes, mudando a paisagem de verão para inverno, para outono.

De repente se separam, ela segue normalmente seu destino. Destino mesmo, na estação do metrô deixando-o para trás. Não era um adeus, iam se encontrar à noite, perguntar como foi o dia um do outro. A paisagem ganhava mais uma pincelada, mas o palco ficava vazio.

terça-feira, novembro 08, 2005

Febre Terçã

Terça-feira morna, terça-feira morta... não há o arraste da segunda, o nem fode nem sai de cima da quarta. Quinta é diferente, só falta unzinho, e sexta... Ah, redenção!

Sem grandes planos, sem é vontade. Terça chuvosa. Terça fria. Tipicamente carioca. Mornamente frio... não basta ser frio, tem que ser gelado... ou queimar a boca... se for morno, eu te vomito.

Grandes planos para quarta. Quinta em si já é um plano... pra sexta. Porque sábado e domingo vai de improviso.

Por isso que eu culpo a segunda, que já erra toda semana, a semana. A segunda é a primeira. A terça, coitada, é um reflexo da família problemática da semana, não tem personalidade, não sabe se é ou-se segunda.

Já decidi: os planos agora começam na terça... não é nem primeira, nem segunda, e nem sabe se é terça.

quinta-feira, agosto 11, 2005

É

Se deve amar.
Se deve amar completamente.
O amor que só sente quando se sente falta, o que se perde uma coisa que não sabia que se amava, que só se aprende quando vai embora.
Amor ainda mais forte, porque este que se perde, sabe que voltará.
E só seu
E principalmente, nosso...

domingo, julho 31, 2005

Luxúria Medíocre

Desde o começo já não via com bons olhos aquilo que pra mim, não representava o símbolo da elegância, ou bom gosto, mas o antro da futilidade e consumismo burro e desenfreado. A tal da Daslu podia dar certo em Nova York, ou em algum país da Europa, mas só no Brasil, ser vendedora da Daslu é sinônimo de status. A filha do ACM (neta?), filha do Geraldo Alckmin, entre outras cuja profissão é “filha”, fazem parte disso. Muito preocupante ver que o governador de São Paulo concorde com tal atitude. Nada contra o desejo da menina em ser vendedora desde pequena, o sonho de infância de vender meias e trocar sapatos todos os dias... que orgulho da filha formada, com estudo no exterior...fala francês e toca piano! HÁ, mas se ela estudasse um pouquinho mais, quem sabe, ela poderia ser padeira. Mas ser vendedora já é uma experiência e tanto... aprende-se todos os dias!!! Além disso, o ar de superioridade, a cabeça erguida, o orgulho desmedido... A inversão de papéis, “a vendedora tem sempre a razão”. Olhe papai, venci na vida!

Mas pra que criticar tanto as vendedoras quando eu posso criticar os consumidores da loja? Claro que eu gosto de boas roupas, bons restaurantes. Mas a diferença é que eu gosto de conforto, qualidade e beleza. Interessante mesmo é ver a classe-média-medíocre entrar na loja e comprar um par de meias pra ganhar a sacola da loja e desfilar como uma bolsa. O gostoso mesmo é andar por aí com aquele saco escrito DASLU bem grande, mas cuidado pro saco não virar, o DASLU tem que ficar o máximo ‘a mostra.

Exercício interessante de reflexão: seria tão bom comprar um terno armani na Daslu, mas sair com ele dentro de uma sacola das Lojas Americanas?

Ostentação é burrice, ostentação desmedida é uma ofensa!

sexta-feira, abril 01, 2005

Castanho-verde-claro

Nunca imaginou que este dia chegaria... mas lá estava finalmente, no trem de sua partida, olhando pela janela, olhando sua cidade, que já ia se transformando numa lembrança, não necessariamente agradável, mas penosa, tanto por partir, quanto por ficar. “Nunca mais voltar”, pensava, e até dava um arrepio na espinha, deixava os olhos mareados. Na cabeça uma certa confusão, uma vontade de olhar pra trás e voltar para os braços dela. Mas tinha decidido, e com essa decisão a incerteza dos novos caminhos, e nada melhor, e pior do que a incerteza dos novos caminhos.

Sempre fora avesso ‘a qualquer tipo de mudança, evitava-as ao máximo. Já perdera muitas oportunidades por temer novos caminhos. E desta vez caminhava por trilhos totalmente desconhecidos...estava muito temerário, mas em mesma dose, seduzido.

Cada vez mais rápido o trem ia deixando a cidade, que não era mais a sua. Queria saber se estava certo, pois a dor estava muito forte; tão forte quanto a vontade de voltar. Só clamava por algum tipo de sinal, qualquer que mostrasse que com certeza haveria a bonança depois da tempestade, porque, realmente, estava chovendo muito, e há muito tempo!

Cansado de provocar em si próprio lembranças e sentimentos de auto-piedade, convencia a si próprio a aceitar o desafio. Fechava a janela e tentava dormir, inutilmente. De repente, um olhar ao lado. E testemunhou um olhar tão intenso, tão acastanhadamente verde, tão mútuo, quanto testemunhou um renascimento. As amarras não existiam mais. E dormiu... um sono muito mais acordado do que sempre tinha sido. E o que teria sido, iria começar a ser. Começava a entender as regras do jogo...

sexta-feira, fevereiro 25, 2005

Fui à Pasárgada e volto já...